Com o começo de nova legislatura nos municípios, vereadores eleitos e reeleitos chegam às câmaras municipais com uma série de ideias para transformá-las em projetos de lei, que se aprovados se somarão a uma montanha de outras leis já criadas pelo Executivo e o Legislativo. A maioria tem efeito nulo no desenvolvimento da cidade e na melhoria de qualidade de vida do cidadão. Para ter ideia, na última legislatura, na cidade de São Paulo, de 2017 a agosto de 2020, foram apresentados 2.969 projetos e aprovados 588.
Por trás da apresentação de projetos, tem muito de boa intenção —- o que não significa que se transformará em boas ação. Tem também a ansiedade do parlamentar em dar solução para problemas que o Executivo não se mostra disposto a resolver —- o que nos remete a outro problema que é o fato de que muitas dessas iniciativas não cabem, por lei, ao vereador; são da alçada do prefeito. Há os que apresentam o projeto apenas para dar resposta a demanda de algum grupo social que faz parte da sua base eleitoral —- e mesmo que não se transforme em lei, o vereador ao menos tem uma desculpa quando for cobrado: “eu tentei”. Ainda existem os que querem apenas aparecer, pegando carona em assuntos de apelo popular.
Em reportagem do jornal Agora, na edição desta segunda-feira, o advogado Armando Rovai, especialista em direito administrativo, eleitoral e empresarial da Universidade Mackenzie, critica o excesso de leis municipais no Brasil. Alguns projetos, segundo ele, “têm como único objetivo autopromover o vereador”. Rovai comenta que a Lei da Liberdade Econômica, em vigor desde 2019, exige que o parlamentar faça uma “análise de impacto regulatório” antes de apresentar “propostas de edição e de alteração de atos normativos”. No entanto, a maior parte dos legisladores desconhece essa obrigação e apresenta projetos sem um estudo de impacto.
O vereador não tem de entender de todas as minúcias da legislação, mas precisa conhecer o seu papel e o seu direito. Um dos caminhos para resolver esse problema, especialmente nesse momento em que novos vereadores estão assumindo suas cadeiras, é o cuidado com a formação do seu gabinete. Os vereadores têm verba específica e número de funcionários limitado por lei ou regulamento interno da casa legislativa, que pode mudar conforme a cidade. Em São Paulo, o vereador pode contratar até 18 funcionários — entre chefe de gabinete, assessor especial, assessor parlamentar ou assessor de gabinete.
Recomenda-se que a escolha desses funcionários, que serão pagos com dinheiro público, seja criteriosa e leve em consideração os temas centrais de um mandato. Por exemplo, se a ideia do vereador é tratar de assuntos relacionados à saúde, é importante que tenha entre os seus funcionários especialistas em saúde pública. Parece óbvio, mas não é.
Ter alguém que conheça a burocracia legislativa —- leis, regimentos, processos, direitos e deveres —- evitará erros na condução das discussões.
Contratar um especialista em finanças públicas ajudará no planejamento dos estudos de impacto econômico.
Um profissional de comunicação permite que o Gabinete desenvolva canais de contato com o cidadão, com a imprensa e outros órgãos de interesse do mandato.
Na capital paulista, será inconcebível um vereador montar seu gabinete, este ano, sem especialistas em planejamento urbano, a medida que um dos principais temas de debate na cidade será a revisão do Plano Diretor e Lei de Zoneamento —- aquele arcabouço de regras que decide como se pretende desenhar a cidade e pode mudar por completo a forma como o seu bairro ou a sua rua serão explorados.
Levando em consideração que muito mais produtivo do que propor uma lei atrás da outra é fiscalizar a atuação do prefeito — saber como ele implanta as políticas públicas ou como administra o cofre da prefeitura — é fundamental que o vereador leve para o seu gabinete gente que está preparada para desenvolver essa função.
Um bom gabinete — com mais técnicos e especialistas do que cabos eleitorais —, rende mais, gasta menos e torna o trabalho do vereador mais produtivo.